André Azevedo da Fonseca
A história do povo de Uberaba foi raptada, encarcerada e passa fome. Nunca contaram nossa história. Quando procuramos nos livros, encontramos sempre as mesmas referências a duas dúzias de figurões que, pelo único mérito de terem sobrenomes, deixaram registradas a sua ilustre presença nos cargos honoríficos que seus próprios compadres os levaram. Não é à toa que a população em geral ignora essa história. De fato, ela não nos diz respeito.
Mas felizmente novos estudos caminham para uma mudança radical dessa perspectiva. Cada vez mais os historiadores têm concentrado a atenção nas pessoas comuns, em vez de estudar apenas a história dos dirigentes. Essa abordagem baseia-se na idéia de que a dinâmica de uma cidade não é movida apenas pelo Estado ou pela economia, mas por toda a sociedade, formada por pessoas como nós, que trabalhamos em nossos empregos, relacionamo-nos uns com os outros e simplesmente vivemos as nossas vidas.
Toda essa complexidade social é o grande tema de pesquisas atuais. Há tempos foi abandonada a idéia de biografia dos “grandes líderes”, pois percebe-se que estes não têm em si todos os elementos para explicar as transformações de seu povo. É claro que, nas democracias modernas, essas figuras representam anseios que na verdade são coletivos. Mas aprisionar a História à vida dos dirigentes, como se apenas eles fossem agentes históricos, é um princípio que contraria a própria lógica democrática.
Sabe-se que a ação individual de homens e mulheres é muito pouco perante as forças do contexto no qual estão inseridos. Ao contrário do que os políticos profissionais e seus assessores costumam pregar para justificar sua existência, transformações sociais nunca são resultados de atos individuais, mas dependem de uma série de pré-condições que a sociedade como um todo impõe através da imprensa, das associações, dos sindicatos e das manifestações públicas. Além disso, como ensina o historiador Paul Veyne, para compreender a sociedade é preciso observar todos aqueles elementos chamados “não-factuais”, os pequenos acontecimentos diluídos no cotidiano, cuja importância social não é percebida imediatamente. Eventos históricos acontecem todos os dias, mas como ocorrem sutilmente em nosso cotidiano, nem sempre nos damos conta de sua relevância.
Se queremos entender como a cidade se tornou o que é, não devemos estudar apenas uma exceção de cidadãos que ocuparam cargos públicos. Essas figuras excepcionais não vivenciam a mesma experiência que nós. Para interpretar a história de nossa gente, devemos olhar para a vida das pessoas comuns em suas contradições e diversidades.
Cada um de nós é um agente histórico de muita importância. Portanto, se quisermos realmente escrever a história dos uberabenses, precisamos nos libertar dos dirigentes para mergulhar diretamente nas vidas dos habitantes da cidade. Essa nova história de Uberaba ainda está para ser contada.
1 comment:
Olá! Sou doutoranda em História na UFMG, natural de Uberaba e gostei bastante de conhecer seu blog. Apesar de não trabalhar com a história de Uberaba, compartilho sua demanda por novos trabalhos acerca do tema!
Parabéns pela iniciativa.
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